aqui não se escreve segundo o acordo ortográfico de mil novecentos e noventa.
Pesquisar neste blogue
quarta-feira, 25 de dezembro de 2013
(muito) pequeno
fostes à gruta ver um homem de fraldas
fostes à gruta ver um homem e dois bichos
fostes à gruta ver um homem e os pais
fostes à gruta ver um homem pobre, sem nada
fostes à gruta ver um homem sem casa
fostes à gruta ver um homem quase sem ninguém
fostes à gruta ver um homem como podiam ser todos
fostes à gruta ver um Deus
fostes à gruta ver Deus
fostes à gruta ver a idiotice de um Deus que se faz homem
numa gruta
fostes à gruta ver o Salvador do Mundo
o vosso, o nosso Salvador
domingo, 22 de dezembro de 2013
duas madrugadas (entremanhã)
se isto não é lindo não sei o que será
sexta-feira, 20 de dezembro de 2013
tus cadenas
porque és burra
os homens prendem-se com olhares
e beijos e abraços
e risos e o tom da tua voz
alguns prendem-se com mamas
e outras coisas que não vêm ao caso
fotocópia
assusta-me e dói
não devia ser tão parecido
com alguém que vi tão pouco
agora tenho saudades
das conversas que não tivemos
terça-feira, 17 de dezembro de 2013
como uma aparição de mim a mim
parecia estar ao espelho
a ver-me por dentro
por baixo da razão
perto do lugar da ternura
e do amor
na loucura nasce a ternura
chorei cavalos
não por ti
por um nós que já não é
que acho que nunca foi
era capaz de chorar mais pelos meus livros
talvez ame demais os meus livros
talvez os ame mais do que te amei a ti
devia fazer como o homem
que casou com a sua almofada
e pôr um anel em volta do Cântico dos Cânticos
os meus livros não partem
os meus livros não desistem
os meus livros não fogem
os meus livros não me deixam a sofrer sozinho
(se sofro é com eles)
hei-de amar o teu cajado
de cajado na mão e botins
as pessoas diziam-me «é louco»
mas para mim é lindo e falou-me
desviando o olhar das pedras da calçada
com que costuma falar
sei que é louco
mas lá dentro vejo um homem
além disso deve haver um amor também para os loucos
uma espécie de misericórdia e salvação
as pessoas diziam-me «é louco»
mas é meu
o meu príncipe desencantado
quinta-feira, 12 de dezembro de 2013
caminhos-de-ferro
que se comem em bancos de jardim
falassem
talvez dissessem do belo que é
ver passar comboios
hoje encontra-se mais romantismo
na observação de máquinas voadoras
ninguém quer saber dos velhos
que ainda esperam uma automotora
na estação em ruínas
para os lembrar do dia
em que ele se encantou
pela boneca de porcelana de olhos que brilham
que voltava carregada da feira
e ele não podia deixar partir
haverá sempre um amor que se prende ao chão
como ao chão estão presos os carris
sexta-feira, 6 de dezembro de 2013
carro voador
profeta gago
eu seria só mais um
também não sei o que dizer e tenho medo
talvez saiba escrever
porque as letras no papel ganham uma vida
já não são minhas
são do papel que as recebe
e de quem as lê
quinta-feira, 5 de dezembro de 2013
casas comigo?
quarta-feira, 4 de dezembro de 2013
recordar uma casa
percorro-a sozinho talvez à minha procura
do que eu era do que eu sou e serei
nas salas da casa só há móveis
cadeiras armários quadros antigos
não resta nada do que eu fui
percorro a casa e não me encontro
queria ter o meu nome gravado
em todas as paredes
terça-feira, 3 de dezembro de 2013
da minha gratidão
em total piedade
sem nada pedir
José Tolentino Mendonça
do que a pedir
e o calor do dia em que contemplo o mar
handicap
quinta-feira, 28 de novembro de 2013
pharmacia
depois de me acusarem de querer fugir
fui à farmácia procurar comprimidos
que curem o meu problema
entre tanta coisa para os ossos
para os dentes para o intestino
para a diabetes para a depressão
para a impotência para a disfunção eréctil
para o vaginismo para os efeitos da tpm
não tinham o que eu queria
não há
e disseram que não prevêem produzir
medicamentos para curar doentes de amor
se eu fujo é do amor
quarta-feira, 27 de novembro de 2013
coprolalia
pratos em forma de couve,
lagartos e sapateiras,
velhos em bancos de jardim,
einsteins e saramagos e mários soares,
estudantes, futebolistas,
são as mesmas que esculpem caralhos.
se elas falassem cuspiam asneiras
como à noite a boca do oleiro
cospe escarras verdes.
sábado, 23 de novembro de 2013
esperança média de vida
aquele melhor poema
(o que ainda está por escrever)
errar bonito é o princípio da poesia
errar feio às vezes também
a solidão não me assusta
a solidão não me dói
quando percorro a casa em ruínas
os pratos ainda na mesa
a cama de casal desfeita
o papel de parede do quarto das crianças
isso é que me dói
aquela vida podia ter sido a nossa
quinta-feira, 21 de novembro de 2013
sintetizador
malas de mão caríssimas
um príncipe encantado
automóveis topo de gama
uma casa com vista para o mar
menos vento nas frestas das portas
alguém para amar
o encanto do teu desejo simples
e a minha resposta rápida
não morro sem te levar a um baile
quarta-feira, 20 de novembro de 2013
resumo breve de uma vida deprimente
que te mude a vida
dorme com dois livros de poemas
homem invisível
cortado às postas
o homem passeia pela cidade
sem que o vejam
já ninguém o via
quando se sentava nos bancos de jardim
a ver os carros passar
e a cravar tabaco
a cidade está cheia de gente que ninguém vê
terça-feira, 19 de novembro de 2013
ecce tu pulchra oculi tui columbarum
segunda-feira, 18 de novembro de 2013
génesis 4, 1-16
se me perguntarem pela família
ou por um amigo mais ou menos íntimo
salta-me a pergunta de Caim a Deus
«Sou eu porventura o guarda do meu irmão?»
perguntem-me antes pelos milhafres
que repousam no cimo dos postes
ou pelos ratos que brincam nas linhas do metro
sempre me poupam do desterro e de uma marca na cabeça
vento norte frio leva a áugó rio
falam em aldeias enterradas em água
e em séries de tv que mudam nomes a terras
eu rio-me deste meu mundo tão só meu
deste sotaque tão gritado
tão variável de concelho para concelho
que nos faz mais ocultos que todos
os alentejanos os algarvios os beirões os durienses
talvez houvesse lugar para um mundo menos meu
assim só há provérbios populares
«a oeste nada de novo»
domingo, 17 de novembro de 2013
missing things
dos beijos que não vamos dar
dos passeios de mão dada que não vão acontecer
dos tempos parvos a olhar para o teu riso e os teus olhos
que nunca vão chegar
são as mesmas das salve reginas que já cantei
e das horas da liturgia
e dos retiros de silêncio
quinta-feira, 14 de novembro de 2013
não voltemos aqui
quarta-feira, 13 de novembro de 2013
rabeta
o teu cachecol engravatado
os teus sapatos castanhos de engraxar
as tuas calças de cantor sertanejo de goiânia
a camisola de alças justa
e o bigode mal nascido às vezes
com a barba impecavelmente feita
eras só um rapaz normal da bulgária
chamavas-te lazar rabeta
e passeavas no parque com a tua namorada ekaterina
em vez de andares na baixa com o teu alfredo
e a tua pochete louis vuitton
pária
cxátrias
vaixias
sudras
eu sou um pária
não tenho nada
não mando em nada
não sou nada
podia bem nem existir
valho menos que uma vaca
e um deus com cabeça de elefante
terça-feira, 12 de novembro de 2013
tanta coisa para limpar
os pretos são todos parecidos
são sinal da tua fuga
nem as luzes brancas no interior das casas
te valem
já não queres cá estar
amanhã nasce o sol em bizâncio
e o que queres
para te iluminar o coração
é contemplar as maravilhas do mundo
em cidades declaradas perdidas
segunda-feira, 11 de novembro de 2013
sou um monge sem mosteiro
sexta-feira, 8 de novembro de 2013
porta da escola
espero o sinal sonoro
para levar os meus sonhos no banco de trás
(esqueço-me que os sonhos não são meus)
útero
porque me pode fechar a porta
da obra criadora de Deus
que eu possa ser mais
ao trazer mais gente ao mundo
pretório de pilatos
lavo sempre as minhas mãos
para me descartar
de responsabilidades sobre o meu corpo
nanismo
somos como anões aos ombros de gigantes
mas já não há gigantes
somos como filhos ao colo da mãe
mas crescemos demais
para que nos peguem ao colo
somos um grão de mostarda
no tempo do ketchup
somos peregrinos sem bordão
que não sabem para onde ir
segunda-feira, 4 de novembro de 2013
love of my life
sexta-feira, 1 de novembro de 2013
inês
Agnus Dei qui tollis peccata mundi
os teus olhos a olhar para mim numa mesa de café
Agnus Dei, miserere nobis
os teus olhos a brilhar (o milagre do amor)
Agnus Dei, dona nobis pacem
quinta-feira, 31 de outubro de 2013
welcome to the desert of my soul
bem-vinda à aridez da minha alma
bem-vinda à miséria da minha alma
se ainda lá quiseres entrar
há muito espaço para ti
um por todos
gosto tanto de ti
papa pepe pipi popo pupu
que era capaz de te amar
se o meu coração tivesse lugar para uma pessoa só
era capaz de amar um clone teu
aos vinte e tal anos de idade
(alguém devia pensar nisso)
assim é difícil entrar tanto na tua vida
é-me difícil entrar tanto na vida de alguém
e não ser de todos
«o pepe papou o papá no popó da mamã»
terça-feira, 29 de outubro de 2013
rita pereira vai de férias
um poema em vez de coração
o meu coração já foi demasiado grande
para o meu corpo
hoje é pequenino
para o amor que te tenho
tenho um osso saliente
por causa do meu coração grande demais
ainda espero
que me venhas fazer crescer a vida
espero por ti
sexta-feira, 25 de outubro de 2013
prince of persia
o teu príncipe pode aparecer a pé
e comprar-te um bilhete de camioneta
se não lhe puderes dar boleia
já não há príncipes em cavalos brancos
não estão a deixar de usar animais no circo?
ao teu filho inexistente
quinta-feira, 24 de outubro de 2013
dropbox
tenho os meus livros
dentro de caixotes
à espera de uma estante
para os arrumar
tenho a minha vida
dentro de caixotes
à espera de quem a queira
desampacotar
quarta-feira, 23 de outubro de 2013
puer
e sentas-te no chão que agarras com todas as forças
como se encher uns punhados de terra
fizesse de ti o dono do mundo
levas areia à boca e comes
porque comer areia nos faz mais rijos
e imunes às doenças
e tu queres crescer e ser um homem
pensas: um dia vou ser grande e experimentar
a solidão
a angústia
a dor
mas sobretudo
a amizade
a festa
e o brilho nos olhos de uma mulher
segunda-feira, 21 de outubro de 2013
coisas que não acho sexy numa mulher
- ter vergonha de estar com os meus outros amigos.
sábado, 19 de outubro de 2013
rio de janeiro. outubro de mil novecentos e treze
de samba e bossa
e alegria e melancolia
e saudade
e amor
e mulheres muitas mulheres
e amigos e vinho e álcool
e praia
e homens que sabem o que escrever
sexta-feira, 18 de outubro de 2013
no alto da montanha
cidade dos homens grandes (i)
as primeiras chuvas em mim
segunda-feira, 14 de outubro de 2013
carros japoneses
muro de pedra
melancholia
não é bem tristeza
é o estado dos que vivem na noite
sem ninguém que os acompanhe de perto
é o estado dos que sabem que vão morrer
por muito que a vida seja alegre
é o estado dos que olham a beleza do mar
e a vêem fugir
é o estado dos que olham para o céu azul
até que venha a nuvem negra
é o estado dos que riem à chuva
antes que venham os espirros
segunda-feira, 7 de outubro de 2013
sol na montanha
domingo, 6 de outubro de 2013
sanguis
corre do peito do apaixonado
um fio de sangue
que apareceu sem avisar
é aí que o poema
se faz carne
e se realiza o que dizem ser
o milagre do amor
quarta-feira, 2 de outubro de 2013
notas soltas sobre poesia
o poema é:
o lugar da alegria
do espanto com a beleza
da presença escondida
do Deus que passeia pela brisa da tarde
e dança
também é:
a arte onde ainda cabem a angústia
a melancolia
a tristeza
o desencanto
(tudo o que a autoajuda tirou
do mundo dos homens)
terça-feira, 1 de outubro de 2013
sinal d'O que está
a mim cabe-me apenas estar.
estar para o que é
estar para o que poderá ser de bom
estar para o que poderá ser de mau
apenas estar
(e já não é pouco)
a arte do encontro
para criar em ti
a dor boa da espera
poucas pessoas me merecem a chuva
até molhar os ossos
é que percebo como sou feliz
é esse caminho do risco
que te faz especial
segunda-feira, 30 de setembro de 2013
ao Deus que dança
é Aquele em que acredito
(O Deus morto por Niestche
o que não ressuscita ao terceiro dia
não é o meu Deus)
nas estradas de Emaús da história dos Homens
que por eles morre e que os faz viver
que deixa o túmulo vazio e
que me põe a dançar,
como David,
em frente à Arca da Aliança
sábado, 28 de setembro de 2013
conversas hipotéticas (i)
terça-feira, 24 de setembro de 2013
onde é a estrada?
há caminhos que escolhemos
e caminhos que nos escolhem
estes são os caminhos do Amor
de todos os amores possíveis
querer escutar
para saber o que sentes
juntei o meu ouvido ao teu coração
(é onde a tradição põe os sentimentos)
só ouvi batidas
e nem sei se eram mais fortes
então trouxe à memória
todos os manuais de psicologia
e encostei o meu ouvido à tua cabeça
(porque, dizem eles, se sente com o cérebro)
não ouvi nada
por muito que esse silêncio falasse tanto
percebi que
tu és um mundo em que não consigo entrar
sábado, 21 de setembro de 2013
non sum dignus
para noventa e nove por cento dos homens
(por fora
e por dentro, onde as coisas são)
ainda mais para mim
que não sou nada de mais
nem onde as coisas são
nem onde deixam de ser
sexta-feira, 20 de setembro de 2013
a inominável
para tentar esquecer-me de ti
mas ele surgia-me imprevisível nas praças
nos nomes das ruas e das lojas
em combinações improváveis
em mensagens de telemóvel
nas cartas do correio
então aprendi que isso não resulta
e fiquei diante do milagre indizível do Amor
scala coeli
uma inscrição:
«tira a mochila das costas
e começa a subir»
quarta-feira, 18 de setembro de 2013
acreditas na vida antes da morte?
Revi hoje uma foto
do mural que diz
«será que há vida antes da morte?»
e pus-me a pensar que faço pouco essa pergunta
e que a devo fazer mais vezes
não é isso, também, a vida eterna?
a gaveta
o regresso
que se vai tornando,
ano após ano,
a certeza dos adeus não desejados
(que eles nunca cheguem)
vem mais um discurso de regresso
"eu, fulano de tal, de volta mais uma vez" [volvitur orbis]
os Benvindos bem-vindos
e os que acolhem
não sei bem porquê
e os que não aparecem a dizer
"devias era ir morrer longe"
e me deixam a pensar
que a unanimidade é uma doença
que cresce e faz crescer a angústia
em mim
o caminho do regresso faz-se de
alcatrão
e terra
e pedras
e borracha
e assentos forrados de pele
e assentos forrados de napa
e assentos forrados de um pano de que não sei o nome
e assentos de plástico forrado de um pano de que não sei o nome
e música
e cartões
e dinheiro na mão
e pés
e nervos
e desejo de reencontros normais
e desejos de reencontros com que não se sabe lidar
e de sono que não há e devia haver
e de vergonha
o caminho de regresso faço-o eu,
como Córdula,
na solidão do meu coração
porque é lá que vos encontro
domingo, 15 de setembro de 2013
examinemos um homem no chão
Testemos a transformação de um homem por terra
A sua natureza tão diferente da lava, a sua maneira mineral
De adormecer.
O que mais interessa é ver o seu lugar rodando para perceber o eixo
Que o move no mundo
Ou como pode a sua posição orientar as aves e os astros.
Interessa também a pedra que ele agarra como alimento
Ou que mão escolhe par lhe servir de funda
─ se é que não usa a própria boca para lançar o grito.
Examinemos a sua semelhança com um meteoro que cai
Uma fisionomia sem vocação para subir ao céu
O peso do seu corpo quando o nosso olhar o levanta.
Interessa perceber o íman que cria para nós um lugar junto dele
Um lugar dentro dele. Há um olhar que nos desloca -
A placa giratória do amor?
Interessa também o coração que ele agarra como fruto que colhe
Ou que veia abre no corpo para beber
─ se não é que é a pedra o que ele bebe com as mãos.
Examinemo-lo como quem sai de casa e vê o seu irmão
Examinemo-lo voltado, em viagem, a orientação discreta
De quem cava no peito a bússola.
Interessa reparar como tropeça no mistério
E se levanta a pedra para compreender.
sexta-feira, 13 de setembro de 2013
ilusão/desilusão
viajante nocturno
é que vou
à procura do sentido da vida
ao fundo uma luz
terna, suave,
ilumina os estreitos carreiros
para me provar que não vou sozinho
e tenho para onde ir
segunda-feira, 9 de setembro de 2013
o antigo conhecimento perdido ocidental
pede perdão muitas vezes
chora muitas vezes
mas nunca apagues nada
não deixes para trás nada
do que a vida te trouxe
Oh me! Oh life!
Of the endless trains of the faithless—of cities fill’d with the foolish;
Of myself forever reproaching myself, (for who more foolish than I, and who more faithless?)
Of eyes that vainly crave the light—of the objects mean—of the struggle ever renew’d;
Of the poor results of all—of the plodding and sordid crowds I see around me; 5
Of the empty and useless years of the rest—with the rest me intertwined;
The question, O me! so sad, recurring—What good amid these, O me, O life?
Answer.
That you are here—that life exists, and identity;
That the powerful play goes on, and you will contribute a verse.
Walt Whitman
quarta-feira, 4 de setembro de 2013
luz ao fundo
e de voltar a trilhar pela pequena estrada
que me leva não sei onde
doem-me os pés
e a luz que vejo ao fundo da estrada
- gosto de caminhar de noite, quando já se vê o sol -
vai fugindo de mim
para me ensinar que o caminho não acaba
terça-feira, 27 de agosto de 2013
pensamentos moralistas (i)
inútil
segunda-feira, 26 de agosto de 2013
cordeiro silencioso
construo a minha vida
no Deus do mundo injusto
que me fala onde não o percebo
no Deus que se cala
quando precisava de o ouvir
no Deus que me faz cair de joelhos
e me faz andar mesmo quando não sei para onde ir
no Deus que me conduz
por caminhos desconhecidos
domingo, 25 de agosto de 2013
tomorrow in the sky
(Jb 19, 25)
que na cadeira onde te sentas agora
a olhar para Deus
te lembres de mim
que Deus se possa rir contigo
como nos rimos os dois
sexta-feira, 23 de agosto de 2013
autoajudo-me
tanta fotografia em tanto lado
e nem uma acompanhada pela frase
«quando a gente gosta de verdade
o mundo nos sustenta»
tenho várias sem texto a acompanhar
mas que poderiam bem ter escrito
a letras de sangue
«uma gaivota que passa,
e a minha ternura é maior», de Álvaro de Campos
«Nas pálpebras da noite chorei
cadências que me ensinaram
que o Amor ama-se
Assim teus
Olhos.», de Daniel Faria
e
«Ouve o que diz a mulher vestida de sol
quando caminha no cimo das árvores
"a que distância deixaste o coração?"», de Tolentino Mendonça
quinta-feira, 22 de agosto de 2013
lanterna em tempo de escombros
quarta-feira, 14 de agosto de 2013
falling for you
não me levanto mais
e continuo a cair
para dentro de mim (de nós)
lucidez
segue a tua vida na senda de uma palavra:
fé.
segue a tua vida na senda de uma palavra:
esperança.
segue a tua vida na senda de uma palavra:
amor.
previsão vs. ignorância
terça-feira, 6 de agosto de 2013
o verdadeiro amor
no bolso de umas calças velhas
que já não te lembras onde deixaste
um dia alguém há-de encontrá-las
e pô-las a secar com os bolsos para fora
penduradas numa corda de sisal
nesse dia o amor fugirá
para poder correr o mundo
e soarão músicas pirosas
quarta-feira, 24 de julho de 2013
romeiro
já não é ao olhar para a terra que encontro respostas
já não são estes homens que me conduzem
já não vejo homens que me pudessem conduzir
mas sei que o homem é o animal que anda de pé
e olha em frente e olha o céu
que me conduzas Tu, do Céu
e que conduzas os homens que nos guiam
e não sabem para onde vão
terça-feira, 16 de julho de 2013
quinta-feira, 27 de junho de 2013
Onde vamos estar daqui a vinte anos?
segunda-feira, 24 de junho de 2013
a árvore da vida
que, por amor, morre na Cruz
e a transforma em Árvore da Vida
ressuscitando ao terceiro dia
sexta-feira, 21 de junho de 2013
Meditações do campo de batalha
quarta-feira, 19 de junho de 2013
lilia agri (ii)
enquanto passeio pelo campo
e me arranho nas silvas
contemplo os lírios
para me lembrar
que as razões para a alegria
são mais que para a tristeza
segunda-feira, 17 de junho de 2013
às escuras
às escuras
no velho escritório
irritam mais
que as pancadinhas de Molière
terça-feira, 11 de junho de 2013
bloco de notas aberto no parque
pela beleza dos jacarandás
é a cola nos pés
ao pisar a calçada
quinta-feira, 23 de maio de 2013
O elo mais fraco
sexta-feira, 10 de maio de 2013
helicóptero
quinta-feira, 9 de maio de 2013
tirar essas coisas das nossas cabeças
quarta-feira, 8 de maio de 2013
merabilia mundi
cárcere
terça-feira, 7 de maio de 2013
que animal é o amor?
sexta-feira, 3 de maio de 2013
Sobre a preocupação com os pobres
segunda-feira, 29 de abril de 2013
petite victoire
lê josé rodrigues dos santos
por muito que imodesta,
ganhou-lhe aos pontos
sábado, 20 de abril de 2013
da minha irritação com a auto-ajuda
quarta-feira, 17 de abril de 2013
corpo de delito
o olhar de mafioso
ou de quem faz esforços escatológicos
os músculos de dez horas diárias de ginásio
a roupa justa ao corpo
são trabalho a mais
para ficar com um corpo de ladrão
terça-feira, 16 de abril de 2013
fazeres-me falta
segunda-feira, 15 de abril de 2013
do analfabetismo
que já não me vinha à cabeça há muito tempo:
parteleira.
(veio-me à memória por boas razões, não necessariamente as mais católicas)
à conta disso
lembrei-me do prof. Cyber Tran,
um homem que está par' lá deste mundo
infelizmente
(sorte tem Deus, que deve estar a ouvir órgão no Céu)
sexta-feira, 12 de abril de 2013
juízo final
para seres salvo responde
à pergunta gravada numa parede:
«acreditas na vida antes da morte?»
- grava-a no teu coração,
e ele deixará de ser de pedra -
acreditar na vida é
saber onde está o nosso irmão.
o crime de caim foi deixar de ser
o guarda de abel
segunda-feira, 8 de abril de 2013
oitenta graus de amor
no dia em que me pus à venda
por não querer mais estar sozinho
esperei por ti
e não apareceste.
quinta-feira, 4 de abril de 2013
lilia agri
quarta-feira, 3 de abril de 2013
Aleluia
de ti
por ti
para ti
sem ti
ante ti
perante ti
depois de ti
longe de ti
fora de ti
além de ti
contra ti
sobre ti
sob ti
dentro de ti
Jorge Sousa Braga in O Novíssimo Testamento e outros poemas, Lisboa, Assírio & Alvim, 2012.
terça-feira, 26 de março de 2013
tempus fugit
segunda-feira, 18 de março de 2013
meetings time
suor
cansaço
dores nos pés
sono
ideias parvas
tempo sentado
piadas
pessoas sérias
contar até vinte
andar de um lado para o outro
contar com a complacência alheia
reunir
unir
ir
quinta-feira, 7 de março de 2013
senhora do socorro
para rezar pelos muçulmanos
(onde já houve uma mesquita)
e para rezar pelos que andam na guerra
(onde esteve um forte das linhas de torres)
lembrava-me desse pequeno pormenor:
nunca houve uma professora bonita
que tenha feito de mim um homem
ou hoje os putos têm mais sorte
l'autobus
num autocarro para lisboa há:
pessoas que não se lavam com regularidade,
pessoas que atendem telemóveis aos berros,
pessoas que vão a falar ao telemóvel durante uma hora,
pessoas que se sentam no banco contrário à janela
para não levar ninguém ao lado, mesmo tendo pago só um bilhete,
muitos velhos,
poucas mulheres bonitas (que, a haver, costumam entrar no bombarral),
wifi, só quando o condutor é jovem,
e gajos que escrevem sobre isso na internet.
poema rural em rima
que maravilha é
ficares espantada
enquanto vais sentada
na autoestrada
ao veres uma pereira sulfatada
[que, a propósito, é de se admirar
se estiver sozinha no pomar]
quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013
little poem to the west of portugal
A minha terra é a melancolia
o meu país é a solidão
a minha pátria é estar só
e viajar
da minha terra às vezes vê-se o mar.
quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013
um pedido: eclesiofilia
Isto que vos peço, a cada um dos cristãos que me lê e, em particular, àqueles que têm uma missão de maior responsabilidade na Igreja, faço-o como uma última homenagem ao pontificado de Bento XVI. Não me esqueço das suas palavras na missa que antecedeu o Conclave em que havia de ser eleito. Não me esqueço das suas palavras durante a sua visita a Portugal, quando disse que os piores ataques à Igreja vêm de dentro e não do exterior. Não me esqueço que ele falou na necessidade de varrer, de uma vez para sempre, esse lixo da Igreja de Jesus. E não me esqueço que, se lhe estamos mesmo gratos, lhe devemos a obrigação de levar isso a sério. Por ele e por todos os que dão testemunho de Cristo na vida secular e já começam a ficar sem resposta a tanta notícia de jornal, a tanta denúncia de encobrimento e de má gestão do pessoal.
Precisamos de ter verdade prática para anunciar, de obras de verdade que consubstanciem a Verdade que anunciamos. Não há fé sem obras nem obras sem fé. Mostrem a vossa fé nas obras, é tudo o que vos peço, para que nós, que vivemos do anúncio do Evangelho, possamos mostrar que as obras daqueles a quem anunciamos só podem melhorar se lá for posta a fé.
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013
agradecer a Pedro
domingo, 3 de fevereiro de 2013
[carta com destinatária indefinida]
nas noites de bares
com música ao vivo
é que tenho saudades
dos teus olhos
sinto a tua falta
[mesmo que não saiba
(e virei a saber?)
quem és]
terça-feira, 29 de janeiro de 2013
doce solidão
alguém a quem mandar uma sms
uma carta
um fax
um telex
um telegrama
sinais de fumo
mas não posso
foste embora
e não estás cá para mim
a culpa é minha.
desde que decidi ficar sozinho
para ser para os outros
o que não tenho para mim
terça-feira, 22 de janeiro de 2013
perdeu-se um coração
faz falta às redes sociais
a partilha de imagens a dizer
que se perdeu um coração
e pessoas desaparecidas
esquecemo-nos sempre disso
«perdeu-se um coração»
junto do rio arnon
- que já ninguém sabe onde fica -
e não há quem monte uma expedição
para o resgatar
dir-se-ia pelos vales
e grande seria a festa
por um só coração que se encontra
«sabes?
achei um coração
o maior dos tesouros»