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quinta-feira, 23 de maio de 2013

O elo mais fraco

Saiu hoje nova legislação a regulamentar a disciplina de EMRC. Sobre o assunto tenho a transmitir três notas principais.
1. Há que assumi-lo, esta está entre as leis mais criminosas que já se aplicaram nos últimos tempos na área da educação. E, há que dizê-lo, ninguém está minimamente preocupado com isso. 
A Conferência Episcopal, que saiu claramente derrotada das negociações com o ministério, mantém-se em silêncio (um silêncio a que já nos tem habituado sempre que devia marcar posição, desde a lei do aborto à do casamento entre pessoas do mesmo sexo e seus derivados). 
Os sindicatos preocupam-se mais em defender os que já se reformaram do ensino ou os que estão em vias de o fazer do que a nós que ainda cá estamos (é a prova provada de que os sindicatos na educação querem defender os professores comunas e não os professores). 
Os outros professores, pelo menos a sua grande maioria, nem sequer deram por nada e quando derem até vão concordar com a decisão - o grosso do corpo docente das escolas é anti-religioso por natureza, tem um entendimento negativo da lei de liberdade religiosa (como o próprio estado, mas sobre isso falarei adiante), acha que EMRC não serve para nada e, muitas vezes ostensivamente, desconhece que a nossa disciplina tenha um programa desconhecendo também, logicamente, o seu conteúdo.
Os próprios fiéis da Igreja estão-se a marimbar para este tipo de assunto. A maior parte das pessoas já se põe sob a capa da Igreja apenas por uma questão de superstição e medo da morte e os outros estão mais preocupados ou com a forma de se celebrar Missa ou com a conformação da Igreja ao sistema axiológico da sociedade civil.
Nós próprios, professores de EMRC, salvo honrosas excepções, estamos pouco preocupados com isto. Ainda nos vamos entretendo com o discurso da esperança enquanto estragam o que falta da nossa disciplina. Devemos ter esperança, sim, mas não perder de vista que estamos em luta. Fomo-nos esquecendo que um professor de EMRC é um cordeiro no meio de lobos e o resultado vai ser a razia de horários que vai acontecer para o ano, vai ser a sujeição à boa vontade e simpatia dos directores que vai acontecer para o ano, vai ser o fim do trabalho de continuidade que, apesar de tudo, a legislação actual sobre as colocações dos professores de EMRC ia permitindo. Precisamos de voltar a lembrar-nos de que estamos num meio adverso para que o possamos tornar num meio dócil, para que possamos, no verdadeiro sentido da palavra, evangelizar a escola.
2. Esta lei vem provar que vivemos num país de merda, num país governado por cobardes - repito, num país governado por cobardes, repito, num país governado por cobardes. Depois de terem, no ano lectivo anterior, decretado, através de um decreto-lei do mesmo género, o início do fim do ensino artístico com a extinção da EVT, agora decretam o início do fim do ensino religioso nas escolas públicas. Podiam, ao menos, ter a coragem de acabar com as coisas de uma vez sem andar a sujeitar professores e alunos - que, espanto dos espantos, são SERES HUMANOS, PESSOAS - a estas merdas sem jeito nenhum.
Vivemos num país de parolos e anormais. Não sentem complexos por deixar de ser o único país da Europa que tinha no seu sistema de ensino um entendimento positivo da laicidade do estado e da liberdade religiosa (entendia-se que todos têm direito a estar presentes na escola) - esta legislação nova de EMRC é o caminho para o fim do ensino religioso nas escolas, atrás do qual virá a redução da dimensão religiosa à esfera privada e atrás do qual virão, quando já não se der por isso porque se ficou entretido a aplaudir o definhar da religião, outras reduções à esfera privada de outras coisas, como é próprio de qualquer totalitarismo, como este para o qual caminhamos sem querer ver. Preferem medir a modernidade pelo alinhamento com os outros: temos de ser como os países do centro e norte da Europa onde os maricas se casam como se o que é diferente fosse igual, onde se assassinam vidas intra-uterinas e onde os velhos pedem para morrer e alguém lá vai fazer o serviço com um sorriso (não percebem que a matriz cultural desses países não é igual à nossa e que isso há-de ter alguma influência, mas isso aprende-se em EMRC por isso não deve interessar para nada). Eu, maluco que sou, prefiro medir a modernidade pela irreverência de se ser único em alguma coisa, sobretudo se essa coisa beneficia as pessoas.
Vivemos num país de gente desatenta. Já aconteceu com EVT, agora acontece com EMRC, ponham-se a jeito antes que seja com a vossa.
3. Os únicos que estão verdadeiramente do nosso lado são os alunos. Como sempre, os fracos com os fracos. Como sempre, uma lei para lixar os mais fracos (como já tinha acontecido com o EVT, apesar da falange de apoio que os professores da disciplina conseguiam reunir no meio escolar e que nós, de Moral, claramente não conseguimos). Os professores mais fracos e os alunos, fracos, para quem, garantidamente, o governo se está a cagar. Esta gente anda a arruinar este país. Não querem que se fale da Constituição (olha, em EMRC também se fala da Constituição, várias vezes, em vários anos! Deve ser por isso que não interessa para nada) porque estão a fazer tudo para que ela, nos serviços públicos, deixe de se cumprir. Sublinho, nos serviços públicos. Para se ser um português com os direitos reconhecidos pela lei fundamental vai ser preciso recorrer aos privados: se quer ter EMRC, um colégio católico; se quer apostar no ensino artístico, uma escola privada que aposte nessa área; se quer aprender uma língua estrangeira, um colégio internacional. Os que não puderem recorrer aos privados continuarão a ficar cada vez mais fracos, até se tornarem transparentes.
É com esta referência aos alunos que queria terminar: se estou preocupado com o fim das horas com menos de dez alunos e com o concurso para os professores de EMRC (o concurso preocupa-me, sobretudo, porque sei como é a distribuição e atribuição de horários para a disciplina na maioria dos agrupamentos e porque uma disciplina facultativa como a nossa depende, imenso, do professor e da proximidade que se vai criando com os alunos e a comunidade escolar em geral) é por causa dos alunos e do seu superior interesse. Porque sei que isto está a ser feito de propósito. Porque sei que não convém a quem manda nisto que os alunos que não consigam convencer nove colegas a ter EMRC com eles aprendam a ter uma visão crítica do mundo, a pensar pela sua própria cabeça, a conhecer os princípios de ética e moral por que uma sociedade humana se devia reger. Porque esta gente acha que isto não interessa a ninguém, nem aos poucos que ainda vão sobreviver como alunos da disciplina (se houver professores que cheguem para aturar isto). Estas leis mostram que caminhamos para uma ditadura e eu, preocupado com os meus alunos - comigo não estou muito preocupado, sou novo e com bom corpo para trabalhar - não quero que eles vivam numa.

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