blogue de poesia e teologia.

aqui não se escreve segundo o acordo ortográfico de mil novecentos e noventa.

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quinta-feira, 30 de julho de 2015

Vivo eternamente em Saint-Tropez

a esta hora e nesta solidão
não dá para achar a praia bonita
nem para não temer la mer,
esse mar que só por nós,
navegadores, é tratado
como um homem, um adversário.
ao longe há umas senhoritas
a percorrer o areal
levando vestidos retrô
e sandálias douradas na mão.
parece que elas
não têm medo do mar ou das ondas
ou do que a areia esconde.
o meu medo estranho
é sinal da minha cobardia,
é que nunca tive especial compaixão
pelos pescadores.

terça-feira, 28 de julho de 2015

Beira

na cidade, em tempos,
esperava-se o futuro.
isto foi antes, muito antes,
da enxurrada que a destruiu
não deixando
pedra sobre pedra.
ainda há, contudo,
quem acredite
que a vida se reerguerá
e será possível, de novo,
guardar silêncio
à beira do rio.

terça-feira, 14 de julho de 2015

(um) amanhã

aos dias de dor e tristeza
sucederão
tempos de luz e festa

ainda uma última
casa para a esperança

passeio de bicicleta

era tão fácil roubar-te essa ideia
de querer ser um pássaro
e poder voar,
dá um verso tão chamativo
e emocionante.

a noite vai longa
e eu queria ser o meu gato
a vaguear pela casa
e a miar por comida
e festas no lombo.

tu nem sabes que eu te leio
mas, se um dia o souberes
digo hoje, com uma imagem feia,
que me farias ronronar.

levar-te a voar,
no brilho dos olhos
e no calor de mãos partilhadas,
seria uma hipótese a considerar.

quinta-feira, 9 de julho de 2015

statio

Para Armando Silva Carvalho

não dá para pensar
na estação dos comboios
da minha terra
como tendo sido, um dia,
nova e movimentada.
sempre um lugar perdido
ao fundo da encosta
e resguardada, guardada
por árvores frondosas
com ar velho.
enquanto desço o carreiro
que conduz à estação e,
por ela, lentamente,
ao mundo todo,
envelheço à pressa
e tudo é western,
senhoritas a abrir a sombrinha
ao deixar a locomotiva
acompanhadas de seus cavalheiros
(a locomotiva assobia
uma melodia de órgão de tubos),
cavaleiros de espada em riste
à conquista do castelo.
chegado à estação
só queria que estivesses aqui,
que me desses a mão,
que os teus olhos vissem isto,
que nos sentássemos na plataforma
e apoiasses a cabeça,
de novo,
no meu ombro.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

pastel de nata

em certas ruas
o amor corre depressa demais
escorregadio demais
para que o possamos agarrar

por esses lugares
passamos tão acelerados
que nem dá tempo de parar
para pensar no assunto
ou olhar com olhos novos
a beleza de um prédio art déco

segunda-feira, 6 de julho de 2015

esquerda insatisfeita

passava tudo por um reencontro
entre a música ambiente
e o ritmo do coração.
uma tarefa custosa,
demasiado difícil,
um encontro mais
entre o que nunca veio
e o que está por fazer.

a jarra com flores murchas
ao canto da sala,
a memória de uma melodia
assobiada baixinho
pelo avô.

sexta-feira, 3 de julho de 2015

wind blows

para onde ir
quando o mundo arde?
que terrenos pisar
quando é obrigatório
andar sobre escombros
em chamas?
onde se esconderá ainda
uma via silenciosa
e pacífica?
uma última alternativa:
escolher como caminho
o ponto para onde
o vento sopra.