aqui não se escreve segundo o acordo ortográfico de mil novecentos e noventa.
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quinta-feira, 18 de dezembro de 2014
sicómoro apodrecido
como cortaram o sicómoro
que havia ao pé da minha casa
agora não me divirto a brincar
com as suas folhas pequenas
que caíam como helicópteros
tenho brincado muito pouco
é essa a conclusão
tenho muito para mudar
quarta-feira, 17 de dezembro de 2014
éter
domingo, 14 de dezembro de 2014
makas antigas
lêem-te ainda melhor
como se eu à distância
te conhecesse melhor
te sentisse mais
te tivesse mais perto
(este paradoxo que é
sempre o primeiro
dos lugares-comuns)
o meu coração à distância
tem muitas saudades tuas
quase como a água
constantemente
a lembrar-se da fonte
isso é outro lugar-comum
mas não deixa de ser verdade
quinta-feira, 11 de dezembro de 2014
sol espelhado na água
desmontar uma cana de pesca
é como desmontar uma casa.
as várias peças dispersas
por sacos e caixinhas
como as vidas dos que partem
e linhas e anzóis na boca
um gosto estranho que fica
a sangue e ao que vivemos ali
quarta-feira, 10 de dezembro de 2014
do nono livro das questões
o cão que rói restos de uma mesa
à sombra das árvores
ou o vento que fica
após a partida do metropolitano
um homem em busca
do que nunca encontra
e que perde todo o tempo possível
a calar-se
há pouco poema nos jogos de palavras
a poesia joga-se no que fica por dizer
um outro príncipe, maior
café aquário
bolos e água fresca
a beleza esquecida
dos rituais de acasalamento
das aves
terça-feira, 9 de dezembro de 2014
never easy
a quem escreve melancolia
dizia uma frase escondida
no fundo de um velho baú
de quem nunca teve estratégias
para encontrar paixões novas
e ignorava os conselhos dos amigos
e dos manuais de cavalheirismo
preferia sempre os caminhos solitários
que estão cheios de erros
e se descobrem inúteis
a não ser para encontrar a melancolia
e a angústia, sempre a angústia
sábado, 6 de dezembro de 2014
rusga na rua da amargura
na rua da amargura
grupo de operações especiais
carros a apitar
metralhadoras nas mãos dos polícias
e os velhos à porta da taberna
de mãos na parede enquanto são revistados
um velho que pensa na vergonha de estar assim
cu voltado para um polícia
e a revista que começa
com coisas perigosas a saltar dos bolsos
carteiras de couro ruças
navalhas canivetes corta-unhas
trocos para copos de vinho
boletins do euromilhões
uma cautela da lotaria
papéis suados
um lenço de papel
e a fotografia de uma mulher que já morreu
enrolada em papel de parede com florzinhas
que tem lá escrita a palavra amor
esse homem acompanhou os agentes à esquadra
porque o amor é a pior das drogas
quarta-feira, 3 de dezembro de 2014
quarta oração da noite
Às vezes luto com Deus,
às vezes danço.
Uns dias discuto com Deus,
noutros descanso.
Não me canso
de olhar para o Céu
e em Deus buscar respostas
ao que a vida deixar por dizer
e às vezes é tanto.
Um silêncio vale mais que mil palavras,
disso poucos se conseguem lembrar.
c. r. & f. no populus
uma verdade escondida:
os poetas pertencem ao povo
e à terra remexida por arados
mais do que às palavras,
tanto quanto as palavras
são da terra por lavrar.
os poetas são lavradores
de enxada na mão
e suor no rosto e no peito
a escavar fundo no silêncio
procurando tesouros escondidos.
as letras dos nomes: v.
as letras dos nomes: i.
as letras dos nomes: c.
obliteração
pelo amor é que vamos sempre
diz o lugar comum
e a rapariga sentada no eléctrico
de bilhete na mão a desfazer-se
com o poder que o suor nervoso
sempre transporta
é o pica que não chega
para fazer um furinho no papel
com um alicatezinho esquisito
ou uma caneta que não já não escreve
mas faz imenso jeito
quando a maquineta de furar
fica perdida num bolso
três bancos depois o pica passa
boa tarde um furo obrigado e boa viagem
e ela obrigada obrigada risos
e a cara a avermelhar-se
não é hoje ainda que te levo a passear
no jardim do bairro
não é hoje ainda que brinco
com a tua maquineta de fazer furos em papéis
e com as tuas mãos bonitas