blogue de poesia e teologia.

aqui não se escreve segundo o acordo ortográfico de mil novecentos e noventa.

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domingo, 28 de janeiro de 2018

idolátrica

esperava um anjo
saído de uma canção
do ben harper
só porque me disseste
que era linda
essa canção do ben harper
e naquele tempo
podiam sair anjos, flores,
luz, o amor, a salvação
de tudo o que achasses lindo.

ontem vi-te e não te falei.
não tenho coragem,
continuo igualmente estúpido,
a mesma besta insensível.
voltei a casa ao som do ben harper,
uma hora de waiting on an angel
e a canção a ser realmente linda
enquanto cantava o refrão aos berros
a despejar saudades tuas pelo carro
mas já sem esperar que dela saiam anjos.
na verdade, sem esperar que nada seja lindo
só por me lembrar de ti.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

essere

o desejo batido
de ser o poema,
ser poema,
a não concretizar-se nunca,
a utopia a ter lugar

janelas estreitas

ao entardecer
espreitava por debaixo das casas
buscando alguma vida ainda,
alguma luz ainda
no meio da escuridão
e às vezes nada,
nem luz nem sopro
nem som algum,
talvez memórias
de um outro tempo escuro.

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Costel, afagador de soalhos

Costel, romeno, afagador de soalhos. O meu patrão, também dono de uma sex shop, distribui catálogos da loja aos clientes enquanto descarrego as máquinas da carrinha e vai à cartola de vinho da casa molhar o bico, sempre mais de um copo de vinte centilitros, enquanto estou no meio do pó das madeiras ou a polir o chão. De vez em quando o meu patrão vem ter comigo e grita «tu é burro, tu é nhurro», sempre com os érres muito enrolados, como se o meu mal fosse ser atrasado mental e não apenas vir de um país estrangeiro. Uma vez perguntaram-me se era médico, engenheiro, quem sabe músico ou artista plástico, aqui todos os emigrantes do Leste são médicos ou engenheiros ou professores de qualquer coisa, e eu era apenas tratador de cavalos. Tenho saudades dos cavalos muitas vezes, não gritavam comigo sem razão.