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segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A igreja-caravela

Finalmente está pronta a igreja-caravela do Restelo, dedicada a São Francisco Xavier. Trata-se de um edifício que ficará na história, no mesmo sentido em que fica a interpretação de Conquest of Paradise, de Vangelis, pela Banda Filarmónica Sanjorgense: quando olharmos para ela, vemos estampada a mensagem «Por favor, não volte a fazer uma igreja assim!»
O problema, múltiplo, repete-se infelizmente pelo Patriarcado de Lisboa a fora (falo do Patriarcado de Lisboa por ser a realidade que conheço melhor; provavelmente a situação multiplicar-se-á pelo país se não mesmo pelo mundo...). Além desta igreja-caravela, existirá a igreja-supositório de Miraflores e existem bastantes igrejas-salão, sobretudo na região Oeste [aqui, entenda-se por igreja-salão não o conceito que conhecemos da arquitectura e da história de arte, que é o de uma igreja com naves da mesma altura e que transmita uma sensação de amplitude, mas antes o de igrejas com salão de festas incorporado, como há em Campelos, no Outeiro da Cabeça e, fora do Oeste, na Cruz Quebrada, para deixar apenas três exemplos] - obras que, ainda que aprovadas pelo Secretariado Diocesano das Novas Igrejas têm muito pouco do que um templo católico deve ser. Uma igreja católica deve ser um espaço que possibilita o encontro comunitário, sem dúvida, mas também o silêncio. Deve ser um espaço que manifesta a grandeza e o poder de Deus, mas ao mesmo tempo deve ser simples e prática. Deve, sempre, fazer-nos cair de joelhos, mas fazê-lo por ser um local que nos convida à oração, não por ficarmos espantados com tamanha obra humana. Deve transportar-nos para o mundo de Deus e não fazer-nos louvar os homens que a fizeram (seja em que ponto da obra for, desde arquitectos, engenheiros, artistas que tratam da parte de imagens e alfaias litúrgicas, etc.) - exemplo disso é o Mosteiro dos Jerónimos, qualquer uma das Sés antigas ou o presbitério da igreja da Santíssima Trindade de Fátima (excepção feita à imagem do Crucificado, de gosto bastante discutível).
Além desta questão do respeito pelas normas arquitectónicas do que deve ser uma igreja católica, põe-se ainda a questão do valor monetário de tais obras. Se não deixo de concordar com a afirmação que muitos fazem de que só se faz, na Igreja, a construção de obras ou a aquisição de peças artísticas mais dispendiosas porque queremos oferecer o melhor a Deus, não deixo de achar triste que, independentemente de estarmos ou não em crise, se construam igrejas que sobrecarregam as comunidades cristãs durante décadas quando essas obras, muitas vezes, nem são as que mais beneficiam as referidas comunidades (trocado por miúdos, não acho que devêssemos andar todos a celebrar Missa em barracões com chapa de zinco, mas também não é preciso que as igrejas custem largos milhões de euros quando o seu valor arquitectónico, considerando o seu fim, está pouco acima daquele do dito barracão). Infelizmente, também aqui não faltam exemplos: a caravela do Restelo e o supositório de Miraflores serão só mais duas a somar a uma lista extensa, onde sobressai a igreja dos Pastorinhos de Alverca.
O terceiro problema, com o qual acabarei esta minha reflexão, é o de haverem cada vez menos artistas católicos, ou melhor, verdadeiramente católicos. Se os houvesse, teríamos mais gente a trabalhar graciosamente neste tipo de trabalhos, e com outro tipo de consciência do espaço que estão a criar. É difícil que uma igreja seja uma igreja se quem a desenha não saiba o que se lá faz e como se faz (como será difícil desenhar um centro comercial se quem o desenha nunca foi às compras nem deseja ir, por exemplo). É difícil desenhar um Cristo se nunca ouvi falar dele. É difícil desenhar o Céu se não sei que raio seja isso...
Assim, hoje como sempre precisamos de artistas católicos. Precisamos de católicos.

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