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quinta-feira, 14 de abril de 2011

Quando os colegas se tornam amigos

Quando às reuniões se seguem conversas, almoços, cafés, visitas a casa. Quando nos despedimos para férias com cumprimentos decentes... Quando há nomes, frases, caras, que começam a passear pela minha cabeça e a aparecer por aqui no blog. Quando me começam a cativar, e começo a cativar. Quando começamos a chegar ao essencial uns dos outros, esse que é invisível aos olhos. Quando releio O Principezinho e a emoção já não é só por causa da história em si, e por o livro me ter sido oferecido pela minha madrinha que já está no Céu, mas porque vejo aquilo a acontecer na minha vida. Nessa altura, os colegas começam a tornar-se amigos.

- Por favor... Prende-me a ti! - acabou finalmente por dizer.
- Eu bem gostava - disse o principezinho - mas não tenho muito tempo. Tenho amigos para descobrir e uma data de coisas para conhecer...
- Só conhecemos as coisas que prendemos a nós - disse a raposa. - Os homens, agora, já não têm tempo para conhecer nada. Compram as coisas já feitas nos vendedores. Mas como não há vendedores de amigos, os homens já não têm amigos. Se queres um amigo, prende-me a ti!
- E o que é preciso fazer? - perguntou o principezinho.
- É preciso ter muita paciência. Primeiro. sentas-te um bocadinho afastado de mim, assim, em cima da relva. Eu olho para ti pelo canto do olho e tu não dizes nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas todos os dias te podes sentar um bocadinho mais perto...
O principezinho voltou no dia seguinte.
- Era melhor teres vindo à mesma hora - disse a raposa. Se vieres, por exemplo, às quatro horas, às três, já eu começo a ser feliz. E quanto mais perto for da hora, mais feliz me sentirei. Às quatro em ponto já hei-de estar toda agitada e inquieta: é o preço da felicidade! Mas se chegares a uma hora qualquer, eu nunca saberei a que horas é que hei-de começar a arranjar o meu coração, a vesti-lo, a pô-lo bonito... São precisos rituais.
- O que é um ritual? - perguntou o principezinho.
- Também é uma coisa de que toda a gente se esqueceu - respondeu a raposa. - É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias e uma hora, diferente das outras horas. Os meus caçadores, por exemplo, têm um ritual. À quinta-feira, vão ao baile com as raparigas da aldeia. Assim, a quinta-feira é um dia maravilhoso. Eu posso ir passear para as vinhas. Se os caçadores fossem ao baile num dia qualquer, os dias eram todos iguais uns aos outros e eu nunca tinha férias.
Foi assim que o principezinho prendeu a si a raposa. [...]

Antoine de Saint-Exupéry, O Principezinho, Lisboa, Caravela, 1987 (17.ª ed.), p. 69-70.

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